domingo, 17 de junho de 2012

E agora? A vida segue. Uma simples ida ao supermercado me mostrando o lixo da sociedade.




     Domingo, 19h30. Tudo o que eu não fazer era ir ao supermercado. Mas, por motivos de forças maiores, precisei vencer o ócio dominical de um cidadão lixo de classe média para encarar a magia do supermercado. Como não tenho carro, e as compras estavam apenas a 10 minutos de minha casa, decidi ir andando mesmo. Faz bem a saúde. Recomendação do Dr. Dráuzio. Falou lá no Fantástico. Para chegar até lá, tive de passar por uma avenida bastante movimentada de Campinas e, portanto, como qualquer avenida que se preze, vi pelo caminho o que todos nós, cidadãos de bem da classe média alienada vemos: carros de som tocando a mais pura cultura do funk carioca, cultos evangélicos, igrejas rezando missa, senhoras de meia idade fazendo caminhada, e um senhor de classe baixa desfalecido no chão sangrando no meio fio a mercê dos carros que por ali passavam. O quê? Um senhor desfalecido no meio da rua? Exato. Mas, como bons cidadãos que somos, todos ali estavam prestando socorro, certo? NÃO!
     Exatamente, ninguém que passava pelo senhor deu o mínimo de atenção para o fato. Afinal de contas, pagamos nossos impostos como belos cordeiros, trabalhamos como escravos 5 dias por semana, e domingo não é dia de se preocupar com o próximo, não é mesmo? Ainda mais quando o próximo é um senhor de barba e mal vestido. Ou se você preferir distinguir... um mendigo qualquer. Como se aquele senhor fizesse parte da paisagem maravilhosa de uma grande cidade, as pessoas olhavam para baixo, com asco inicial inerente à todos que tem algum senso e coração, mas logo no próximo momento, continuavam seus afazeres fingindo que o mundo é lindo, belo e que nosso Brasilzão só vai pra frente! Pra frente Brasil! Pra frente! Pagando nossos impostos e seguindo os ensinamentos do nosso senhor, tudo vai dar certo! Amém! Amém!
     Perplexo com tudo isso, perguntei para o taxista se ele ou algum outro f̶i̶l̶h̶o̶ ̶d̶a̶ ̶p̶u̶t̶a̶   motorista poderiam fazer algo, e qual a resposta que obtive? “Eu? Tô fora meu amigo, não vou me meter com encrenca não, ele é quem se vire. Não fui eu quem desmaiei” Eu, na minha inocência, acreditei que as pessoas ligavam para as outras. Levar em consideração um mendigo desfalecido?  Santa inocência juvenil Batman!
     Deparei-me com um cenário bizarro e diário de uma grande metrópole. Assim, decidi que o mais correto, segundo a minha moral, era liga para o corpo de bombeiro ou o SAMU. Eu, um estudante qualquer, simpatizante da nojenta esquerda política, que tem  afeições com aqueles que comem criancinhas... sabe? Aqueles cara que a Veja te disse amigo, não lembra não?  Então, fui eu, o maconheiro da universidade pública, o vagabundo que gasta seu dinheiro estudando, segundo julgam as pessoas, o jovem lixo que sonha com uma sociedade um pouco mais justa, fui eu quem liguei na tentativa de socorrer uma pessoa. Veja só, uma PESSOA. SER HUMANO. Não um mendigo, não um senhor, não um bêbado. Uma PESSOA. E o que ouvi do corpo de bombeiros? “Não podemos gastar ambulância com qualquer um, se não foi ele o autor da ligação, e ele não consegue acordar para dizer que quer ser levado por nós, entendo seu ponto, mas estou seguindo regras e não posso fazer nada. Obrigado pela ligação” E agora? A vida segue.
     Quando eu era criança, minha mãe ensinou que o egoísmo não era bom. Que eu devia me importar com o próximo, que a sociedade é feita de ajudas, e de que eu devia procurar ser sempre uma pessoa boa. Diz que foi um tal de Jesus que disse isso pro padre, que disse isso pras pessoas, que disseram isso pra minha mãe. Ela acreditou e me contou.  E o que eu vejo? Um senhor perto da morte agonizando na calçada como tantos senhores agonizam todos os dias, os cultos, as missas, os impostos em dia e a vida continuando, como se nada tivesse acontecido. Muito obrigado, sociedade. A vida segue.

                                        Kenji - um estudante qualquer de uma cidade qualquer.  17.06.2012

4 comentários:

  1. Caramba, que vergonha que deu de ser uma pessoa agora. Muito bom o texto, cara... infelizmente essa é a realidade, mas parabéns pela sua atitude (devia ser um ato normal, mas infelizmente é digno de parabéns).

    Mas... o que aconteceu com o pobre coitado?

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    1. Infelizmente, nada... a polícia disse que ia mandar uma viatura, mas sabe como é... decidi voltar ao local, e até o presente momento, nada... e a vida segue, não é mesmo?

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    2. Só pra terminar então: a polícia chegou, acordou-o, os caras convenceram o homem que seria melhor um atendimento(por que é só assim que é permitido alguma ação dos bombeiros pela ideia do direito de ir e vir); convencido, a polícia chamou o SAMU que levou o homem.

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